PESCANDO COM DORMINHOCO
Tudo começou em uma tardezita de verão, quando eu proseava e mateava com o meu mano Albrantino Moreira, na beira do rancho sorvendo um mate véio, bem cuiudo e relembrando as belas pescarias, nos bons tempos de guri, lá no poço do Fervor. Sem dúvidas, um dos poços mais fundos e perigosos de toda a extensão do Camaquã, pois tinha tantos redemoinhos que chegara a ponto de receber esse nome, e por certo, não fora um nem dois caíques, de bom tamanho que ali haviam fundiado e por certo também deveria ter um lote de gente se afogado naquele lugar.
Por outro lado o pesqueiro era dos buenos e dava peixe tipo bicho. Uma hora pescando, enchia meio saco e ali só dava peixe munaia, desses que só o retrato pesa de cinco quilos pra mais, mas também pudera, era um lagoão arredondado, com quase cem metros de tamanho para cada lado. Tchê de Deus, se amontoava pintado e traíra lá no fervor.
Da prosa para uma pescaria, foi um upa, assim que, uma semana depois, convidamos o primo Neri Borba, que pra facilitar o entendimento deste causo, eu digo que é filho de Gonçalino Borba, o dono do campo alagado, durante uma enchente, ao qual eu falei em outro causo que contei um dia desses.
Aquele da Enchente no Camaquã.
O Neri, mais conhecido por Pombinha, apelido que trás desde piá, fato que não vem ao caso, pois o fato real é que levamos o índio de parceiro na pescaria, uma vez que, conhecia cada palmo daquela costa do Camaquã, e era um tarrafeador de fundamento, além de ser um parceiro bueno em uma pescaria.
No dia combinado, levantei cedito e tirei uma pedaçama de minhocas. Digo pedaçama, por que no meu rancho, a minhoca é tão graúda, que não se consegue dar uma pazada sem cortar no mínimo um palmo do animalzinho.
Cobra papa-pinto é coisinha perto das minhocas que eu crio, pode-se iscar mais de dúzia de anzóis, com cada uma.
Arrumei minhas tralhas, cevei um mate e fiquei esperando os companheiros.
A idéia, era sair, no máximo, umas dez da manhã para chegar ainda com sol ao pesqueiro, para dar tempo de pescar uns lambaris, pois para a noite não tem isca melhor.
Saímos de fato, antes das dez horas, mas a estrada estava tão ruim, que só chegamos ao pesqueiro à noite, o que para nossa sorte fazia lua Cheia e a noite mais parecia um dia de tão clara, pois já era noite grande, quando andando um pouco de fubica e outro tanto a pé, conseguimos chegar.
Por sorte o Pombinha de fato conhecia aqueles campos pelos dois lados do rio, até de olho fechado, pois caso contrário, acho que teria gorado a bendita pescaria, uma vez que eu sempre viera ao Fervor tinha sido por Santaninha e, desta feita, chegava por este lado do rio, ou para que melhor me entenda, das bandas de Pinheiro Machado.
Com o atraso, não foi possível pescar lambari, de maneira que a única isca eram as minhas minhocas que, felizmente, era quase meio balde delas.
A lua, conforme falei, era um dia de tão clara e assim acomodemo, um fogo bueno, uma cambona de água e uma carnita para assar. Vestimos os anzóis de minhoca, larguemo na água e assim começamos a tirar peixe. Dava peixe de todo o porte e como a pescaria era gorda, os mais miúdos, se largava pra água de volta.
Era quase meia noite, quando resolvi pegar uma linha bem comprida, prender uma chumbada de bom peso e com ela na mão, subi num galho de salso, que se inclinava a oito ou dez passos por cima da água, pra mó de pegar melhor impulso, e mandar a linha mais longe.
Reboliei, três ou quatro vezes, aquela chumbada no ar e joguei o anzol o mais alto e longe que pude e com toda a força que Deus me deu.
Parece que a chumbada criou asas. Cheguei a pensar que ficara engaiolada em alguma coisa, pois perdi de vista de tão longe que foi, até que pelas cansadas, escutei a batida na água, aproximado a duzentos metros abaixo, isso já no poço do barro e não no fervor.
Não que eu pudesse medir, mas pelo barulho e pelo comprimento da linha, que se estendeu quase toda.
Só bateu e já correu e oigaletê... tirambaço forte que deu tchê, chegou a me debulhar como um trapo, de cima do galho quase na boca de um redemoinho.
A minha sorte toda é que a linha era forte, pois o bicho me arrastou por um bom pedaço do lagoão e só não fui engolido por um redemoinho que havia logo adiante, porque terminou o curso da linha e a outra ponta tinha ficado atada no galho do salso.
Nadei por meia hora para desviar os outros tantos redemoinhos, sendo o maior de todos, bem onde emergia o galho do salso que eu havia caído, até que desabei em uma cachoeirinha e cheguei à margem, isso a uns “noventa e nove” metros abaixo do local onde havia caído.
Voltando encontrei o mano com as mãos sangrando de tanto puxar a linha, sem ter conseguido tirar pra fora aquele munaia peixe, pois a linha era forte e aguentou, mas o bicho tironeou tanto, que só ficou no anzol a isca e um pedaço do beiço do danado.
Ao pegar o anzol foi que entendi, porque havia ido tão longe, pois não é que ao rebolear a chumbada, enganchei a fisga do anzol no bico de um dorminhoco em pleno vôo e o bicho fisgado, por certo voou até onde a linha esticou, para então cair já quase na boca do peixe.
Pra arrematar este causo, eu afirmo que pesquei o resto da noite com aquele dorminhoco de isca e, acredite se puder, mas peixe nenhum roubou a isca durante a noite, porque a verdade é que nem com a mão eu conseguiria iscar melhor, pois havera de ser que o anzol tinha entrado pelo bico do bicho, ficando a alumiar a pontinha da fisga, bem onde sai o esterco.
quinta-feira, 29 de julho de 2010
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